domingo, 13 de março de 2011

Um doce que minha mãe me ensinou

Dia desses tocou o telefone aqui em casa. Era minha mãe avisando que era hora de colher as laranjas da terra. Hora de muita ralação e de fazer doce. E a tortura? E a necessidade desesperadora de controlar os doces, os açúcares? Mas vamos em frente. Quem sabe com isto eu consigo adoçar algumas bocas? Quem sabe posso relaxar um pouco nesses dias tensos.

Peguei meu carrinho e rumei pra jacarepaguá. Mas, antes dos sacos de laranja era preciso fazer um almoço a quatro, seis mãos... Ela já havia começado os trabalhos. A Véra, também já estava adiantada na sua parte e a Fátima já havia cuidado dos doces do lanche! Só me restou arrumar a mesa...

Almoço demorado. Muita conversinha pra cá e pra lá. Depois, a louça: ainda bem que esse não é o meu departamento. Cozinheiro sempre encontra alguém para tomar conta desse departamento, não é mesmo?

Tudo cuidado peguei uma tesourona dessas de alfaiate de antigamente e umas sacas e parti para o quintal. É, ainda existem quintais nesta grande cidade... Os dois pés, carregadinhos e com respiração ofegante de tanto peso. Os primeiros a delas se servirem se dão ao luxo de escolher as melhores. E assim fiz eu. As mais verdinhas, as maiores, as mais bem formadas tiveram o corte no talo para ainda pegar umas folhas. Sim, elas são importantes para ajudar a saborizar a calda final. Colocadas com cuidado enchi duas sacolas. Parece muito para uns e pouco para outros. Mas é preciso deixar para o restante da comunidade que aparece lá na casa dela nesta época do ano. Antes era para pegar o doce prontinho. Agora, ela apenas permite que peguemos as laranjas. E cada um que faça seu doce do seu jeito, com suas próprias imperfeições.

Na hora de vir embora, o mais importante era não esquecer meu saco de laranjas... Mas também um eborme beijo nas bochechas magrinhas dela e um abraço bem apertado. Minha mãe tem sido MUITO especial para mim.

Em casa, no dia seguinte, é claro, hora de lavar as laranjas para tirar eventuais poeiras. Afinal a única coisa que poderiam ter: cultivadas apenas com água das chuvas e um terreno maravilhoso, apenas natureza nestas orgânicas.

Todas as vezes anteriores que fiz este doce sempre não ficava satisfeito com os resultados desde a “limpeza” das laranjas até o sabor final. Chato eu? Que nada: apenas procurando tornar o resultado final uma pergunta do tipo: só isso? Ah, assim eu fazia...

Parei e olhei para a primeira laranja. Saquei da melhor contribuição dos americanos para a gastronomia mundial (calma que essa afirmação não é minha: é marca registrada RS): Meu microplane, presentação de uma amigona. Como ele foi projetado para tirar apenas uma fina película (ideal para outras preparações) não ficou do jeito que eu queria. Peguei então um descascador de legumes e, com ele, comecei um novo protocolo de descascar a laranja para o doce. A partir do galhinho dela fui tirando a película verde de cima para baixo.

Depois de “descascada”, cada uma delas, era preciso fazer os cortes das “pétalas” e manter a flor íntegra. Assim, feitos os cortes em formato de cruz, de baixo para cima, de forma que as pétalas fiquem unidas no lado dos cabinhos.
Mas é preciso soltar a casca do miolo. E aqui modifiquei a maneira mamãe de soltá-las. Não com a ponta dos dedos mas usando uma colher de sobremesa (veja detalhe na foto lá embaixo). Eu vi esse procedimento ser feito com figos roxos (aqueles de Valinhos no interior de São Paulo). Testei e aprovei!

Mas a parte mais difícil para mim foi soltar completamente o miolo. Antes, segurava as pétalas com uma das mãos e com a outra rodava o miolo. Algumas vezes isto não dava certo, principalmente com aquelas de polpa fininha. Ai, novamente as observações que muitas vezes passam batidas pelos alunos de gastronomia valeram: usei uma faquinha para soltar. Pronto! Perfeito!

Pode parecer frescura para muita gente que vai ler esse texto. Mas cozinha é processo: se você acha o processo certo, tudo fica melhor: a preparação dos ingredientes, a preparação do alimento, o sabor e o resultado final. Fazer de qualquer forma não lhe garante isso.

Soltas as pétalas, colocar de molho. Processo repetido para cada uma delas. Depois, troca logo essa primeira água. Ah, uma boa dica para mantê-las submersas, é colocar um prato sobre elas. Se necessário coloque algu pesado. Assim a garantia de que todas vão ficar em contato com a água.

A primeira água é a da fervura inicial. Coloquei uma colher de chá, generosa, de sal marinho e cobri até dois dedos acima delas. Fervi por cinco minutos e escorri essa água. Deixei esfriar por uns 10 minutos e coloquei novamente água em temperatura ambiente. Assim foi por dois dias, trocando a água, à toda hora que passava ali onde ela estava.

Quando dei uma mordidinha numa pequena pontinha e não senti o amargor característico estava na hora de terminar: a calda entra em cena!

Um litro e meio de água foi o suficiente para uma dúzia delas. Coloquei 750 gramas de açúcar Native (orgânico) e uma folha das grandes que colhi junto com as laranjas. Inicialmente fogo alto até iniciar a fervura, depois a meia força para manter a evaporação da água e engrossar a calda, além de cozer a laranja. Valda reduzida à metade, foi hora de desligar o fogo.

Hora, também de colocar nos potes e, é claro, provar do doce. Apenas uma pétala, me permiti. Mas, depois que o povo daqui provou ouvi “foi o melhor doce de laranja que você já fez!”. Valeu...

Veja as fotos que tirei do processo. Faça o seu doce aproveitando as laranjas que estão sendo vendidas nessa época. Ah, não esquece de contar aqui como foi.

F A C I L I D A D E S
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3 comentários:

Karina disse...

Que beleza de post, até parece que a gente vai junto, ajudando a preparar o almoço, a colher as laranjas, rs. Só não vi as fotos do doce depois de pronto. Abra~p

Leca disse...

Olá! Li o post na segunda-feira, aniversário da minha mana caçula. Passei na mamãe para participar da festinha, quando me deparo com um tacho de laranjas da terra de molho para fazer doce. Só que as da mamãe eram amarelinhas e percebi que você as colheu verdes. Sabe a diferença?
Beijão!

véra disse...

as verdinhas deixam um "amarguinho" que faz toda a diferença!!!
o lamentável ou insuportável é que temos que respeitar os índices de glicose!!!